domingo

RUAS

É assim mesmo, ocorre quando saio às ruas. Piso as teclas preto e brancas que soam algazarra de crianças. Olhos no chão, cuido livrar abismos. Penso coisas fedidas e molengas sobre a cidade. As instituições natimortas são modernas promessas não cumpridas.

No cimo da ladeira da Carrascosa, antes pouco da curva, um senhor fala sozinho, com panos e panos à venda, à sombra do Tiana. Ele magro, barba por fazer, branca, e olhos apertados. Parece cego, mas não aparece.

A cidade, a calçada e a sombra. Friinha. Um cheiro úmido de mata, um silêncio de gente. Uma esquina é a cidade inteira.

Caminho à rua da Graça onde os palacetes denunciam algo passado. Árvores nas calçadas. As raízes caudalosas fazem do passeio uma fita de Moebius. A terra, o avesso da cidade. A curva na moderna arquitetura imitou a topologia acidentada da natureza, de eras e heras concebida. Há uma objetividade acessível se a cidade em si desfolha o essencial.

Outra cidade, sem brios ou reputação; o anonimato. A verdade chega em trupe. O compartir amigo de imprecisões factíveis. Interpretações que se avizinham. Na linha do verso reescrever o que a notícia borra. Calçadas minadas de carros e fezes, e ainda regozija, salpicado, o cheiro de jaca. Topo a rosa vermelha despachada na garrafa de sidra. Aceno para o garotão levando a gaiola pra passear.

Nativos são defeitos in progress.

Por trás da franja do sonho, o lobo da objetividade quotidiana. Entre a nuca e o pescoço se alojam prestidigitações inconfessas. Reviver em memória quando, o fim, não mais puder andar.