É
domingo à noite. O jardim de um fino restaurante, bairro nobre,
cercado de papoulas e acácias, muro baixo. Uma casa modernista,
portas brancas de madeira e vidro, ladeada de espigões sem boleios.
No interno da casa ambiente climatizado. Cortinas, decoração à
italiana, frios diversos pendurados à delicatessen, cordas, panos
vermelhos e verdes, madeira escura. Quadros retrô, cartazes de
filmes; o vermelho, o branco e o verde. À minha frente, cinco
mulheres fumantes, todas mais de 37, sem homens. Uma delas deputada
conhecida do povo. Um oito anos sobre a mesa. Algumas rodadas
de sushi, gestos largos e despreocupados, conversa solta. Uma ilha.
Ao
lado, uma mesa comprida repleta de casais. Em separado, uma menina e
sua babá não incomodam a efusividade esganiçada do encontro. Um
oito
anos,
carteiras de cigarro sortidas, smartphones
e grandes chaveiros alarme. Não há como evitar os vozeirões e a
gorda algazarra, no jardim da casa de arquitetura modernista
plenamente conservada. Em miudinho, contraponto às grossas vozes, as
mulheres, na outra banda da mesa, uma ao lado da outra, tricotam com
agulhas de vidro. Aqui acolá alguma gaitada se desprende e ressoa na
arquitetura de concreto à mostra.
Saboreio
Insalata
con Pasta.
Uma
mulher sozinha, na mesa dos casais, atende o celular.
Roberto,
passei o dia em casa, só saí pra fazer a feira, diz.
Vim com a Roberta e o Luis Cláudio, depois eles me deixam em casa.
Mas você não quis vir! É incrível uma coisa dessas, é incrível!
Eu te perguntei se você ia andar, e você disse que não! Você
ligou pra me esculhambar? Eu tenho a chave... Se eu não conseguir
entrar vou dormir na mamãe.
A mulher se volta à mesa, toma um gole de água-com-gás, e retoma
ao telefone. Mãe,
talvez eu vá dormir aí, viu? É, pois é, mas quando chegar a gente
conversa.
Nada transparece aos amigos, distraídos. Eu
é que não volto mais pra casa. Ele nunca sai comigo, e não quer
que eu saia? Absurdo uma coisa dessas!
Mastigo
pepinos fresquinhos com cenouras e pimentões amarelos e vermelhos
mergulhados numa taça com água e gelo e uma pitada de sal. À tarde
estive com mulheres do Bolsa Família. Uma dizia: Ele
gostava de me dar namorado. E toda vez que chegava ia me enchendo de
nomes; cada nome desse tamanho! Paciência, tem os filhos; às vezes
o filho é apegado ao pai, a gente aguenta. Mas no dia em que me
bateu, saí de casa.
Fecha
parênteses, a deputada. Uma
enquete, uma enquete: vocês preferem o capitão do BOPE ou o Chico
Buarque? Em termos de libido, o capitão do BOPE ou Chico Buarque?
Hein?!
No pescoço, a empolgação das cordas vocais. Uma confessa: Chico
Buarque.
A
deputada, um tipão, minutos depois retorna do toalete, cambaleando
aos braços com a amiga. Ringindo o salto no mármore, antes de
chegar à mesa, berra: Capitão
Nascimento, meu deus, ô homi lindo!